quinta-feira, 25 de agosto de 2011

A História do Brasil e o Desmame Precoce


Hoje nós sabemos que o desmame precoce dos bebês foi e ainda é (infelizmente) causa da morte de muitos recém nascidos. Isso ocorre tanto pelo oferecimento de alimentos inadequados nutricionalmente, pouca quantidade de alimentos, desidratação e contaminação dos alimentos oferecidos (e sem o leite materno os pequenos têm poucas proteções contra vírus, bactérias e fungos, ficando suscetíveis a muitas doenças). Essa é uma realidade de muitos países, é claro que com características diferentes entre os países pobres e ricos e, no caso do Brasil, com grandes diferenças entre regiões pobres e ricas. Mas o desmame precoce não deixa de influenciar o crescimento da mortalidade infantil em nenhuma das situações.

Esse é um dos motivos para o estimulo ao aleitamento materno exclusivo até os 6 meses e continuado pelo menos até os 2 anos. Buscando assim o oposto do desmame precoce, o desmame natural.

Normalmente quando estamos falando dos motivos do desmame precoce ficamos presos aos mitos e “deficiências orgânicas” maternas, como: leite insuficiente; leite fraco; doenças; problemas com as mamas. Outros motivos bem comuns são os relacionados ao bebê: chora muito, não dorme, não quer. Todos esses colocados como se fossem independentes do desejo da mulher.

Na realidade esses motivos, na maioria das vezes, estão associados a outros fatores como falta de informação e segurança da mãe quanto aos benefícios do leite materno, uso de bicos e mamadeiras; uso de água e chás no intervalo das mamadas; despreparo dos profissionais de saúde no manejo de problemas comuns na amamentação (responsáveis pela indicação de fórmulas artificiais em 2 de 3 casos); propagandas dos leites industrializados; condução inadequada de políticas publicas e fraca atuação dos serviços de saúde.

Agora, se já sabemos o mal que faz o desmame precoce e suas razões, porque não conseguimos reverter a situação, garantindo que todas as mulheres amamentem livremente, chegando ao desmame natural?

A resposta não é tão misteriosa assim! É claro que isso faz parte da nossa cultura! Cultura e valores. E para entender de onde vem isso, vale voltar no tempo da colonização do Brasil.

Podemos dizer que o desmame precoce foi introduzido no Brasil pelos europeus. Quando chegaram ao Brasil ficaram horrorizados com o comportamento das Índias, que amamentavam seus bebês em livre demanda, iniciavam a introdução dos alimentos com massa de grão de milho mastigada primeiro pela mãe, e o desmame ocorria de forma natural, mais tarde.


Essas práticas não eram consideradas dignas da mulher branca. Acreditavam que amamentar enfraquecia as mulheres. E introduziram no Brasil as amas de leite, mulheres consideradas subalternas, que amamentavam os bebês em troca de pagamento.

No século XIX a economia exigia que a mulher ficasse em casa, transmitindo os valores da época. A mulher dentro de casa cuidando dos filhos. E para mantê-la ali introduziu-se o conceito de “higiene familiar”. As mulheres voltam a amamentar seus filhos, mas em horários determinados, tempo de mamada determinado e uso de bicos e chupetas. Nessa situação e ambiente, com tantas regras, logo apareceram os casos de baixa produção de leite e dificuldades no aleitamento. Observem que os problemas foram conseqüência direta do contexto social e a medicina higienista não conseguiu dar respostas. É o inicio do discurso do leite fraco!

No inicio do século XX a sociedade do consumo precisa que a mulher entre no mercado de trabalho. Entrada que ocorre das formas mais precárias possíveis. E ai surge a “solução mágica”, vinda da Suíça, o leite condensado e a farinha láctea. A mamadeira entra nesse cenário como símbolo de modernidade e urbanização.

As fórmulas de leites artificiais começaram a se desenvolver, cada vez mais. A propaganda no meio científico médico foi intensa, e difundiu a idéia de que o leite artificial era um substituto opcional ao leite materno. Ainda mais, criou-se a idéia de que o bebê em aleitamento materno necessitava de complemento para se evitar a desnutrição. A tecnologia ao serviço do consumo e não da saúde das crianças (para ler mais sobre esse assunto e a tecnologia da Nestlé, CLIQUE AQUI).

Só na década de 70 que a ideia sobre a amamentação começa a mudar e a pressão das grandes empresas pelo consumo não consegue se sobrepor à preocupação mundial com os altos índices da mortalidade infantil. Até aqui os pediatras prescreviam mamadeiras e orientavam o uso de água entre as mamadas (será que essa prática ainda não continua?). 

É só em 1980 que o Brasil assume as rédeas da situação e começa a promover o aleitamento materno criando programas como Programa Nacional de Incentivo ao Aleitamento Materno e, em 1990, estimulando a criação de Bancos de Leite e o Hospital Amigo a Criança. Atualmente outros programas são desenvolvidos e já falamos de alguns deles no blog, CLIQUE AQUI para saber da Rede Cegonha, AQUI para saber do Guia dos Direitos da Gestante e do Bebê e AQUI para as orientações da OMS.

Depois de saber dessa história toda e de como o desmame precoce esta enraizado na cultura brasileira, a idéia é não desanimarmos e sim arregaçarmos e irmos à luta. 

Nós, mulheres, já lutamos por tantos direitos, da sociedade, das mulheres e das crianças. Historicamente conquistamos a liberdade das mulheres e o direito de votar. Para encurtar a lista.

Então essa é a hora de lutarmos contra o preconceito de amamentar em público, contra a idéia de que o leite materno é fraco, contra o preconceito do aleitamento continuado, promover a informação das mulheres e lutar para que todas mulheres tenham direito os seis meses de licença maternidade.

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